Quando você e seu sócio não conseguem chegar a um acordo, o que é possível fazer?
Conciliar interesses distintos pode ser uma tarefa complicada, principalmente quando se trata de empresas. Os sócios não apenas precisam zelar por seus próprios interesses, mas também pelos interesses de toda a atividade econômica, o que impacta a realidade de fornecedores, colaboradores, consumidores e a sociedade como um todo. Contudo, nem sempre é possível alcançar um consenso entre os sócios, o que dificulta o progresso da empresa e provoca atritos que podem levar até mesmo ao fim da sociedade. Esse desafio é especialmente acentuado quando falamos de sociedades que possuem apenas dois sócios, com cada um deles detendo 50% do capital social. Lidar com impasses pode levar a consequências desastrosas para a empresa.
Para resolver esse problema e evitar que conflitos se arrastem até o Judiciário, existe uma solução eficaz: a existência de um Acordo de Sócios que preveja a cláusula shotgun.
As chamadas cláusulas shotgun, buy or sell ou cláusulas de compra e venda forçada de participação societária prevêem que, diante de um impasse societário, um dos sócios poderá oferecer um valor para comprar a totalidade das quotas do outro sócio. Caso este recuse a oferta de venda, estará obrigado a comprar as quotas do sócio ofertante pelo mesmo preço proposto. Uma vez que um dos sócios é retirado da sociedade, o conflito de interesses se resolve de maneira rápida e eficaz, possibilitando que a empresa possa seguir desimpedida com suas atividades.
O mecanismo pretende garantir condições justas de negociação por adotar o procedimento lúdico de “cortar o bolo”: uma das partes “corta o bolo” (define qual será o preço da participação societária) e a outra parte escolhe qual será sua fatia (vende as próprias quotas ou compra as quotas do sócio ofertante pelo preço fixado). Uma vez que o sócio que fixa o preço e que invocará o mecanismo buy or sell tem o risco de ser obrigado a vender as próprias quotas pelo valor da oferta, ele não empregará nem valores exorbitantes (para não ter que pagar em excesso pelas quotas de seu sócio), nem valores ínfimos (para não correr o risco de ter que vender sua participação por um valor injusto).
Existem diferentes modalidades da cláusula shotgun, cada uma com seu propósito específico:
Russian roulette: Nessa modalidade, um dos sócios envia a proposta de compra e venda de suas quotas e o que a recebe pode escolher entre vender suas cotas nos termos propostos ou adquirir todas as cotas do sócio que invocou a cláusula.
Texas shoot-out: Aqui os sócios devem trocar entre si envelopes lacrados contendo propostas para aquisição da participação societária um do outro. Aquele que apresentar a proposta mais alta deverá comprar a participação societária do outro pelo preço de sua própria oferta. A lógica por trás desta modalidade está em entregar o controle da sociedade ao sócio que mais enxerga valor na empresa.
Mexican shootout ou Dutch Auction clause: Diferentemente do Texas shoot-out, após a troca de envelopes, o sócio que apresentou a proposta mais baixa deve vender sua participação societária pelo preço que ofereceu. A ideia aqui é que o sócio que ofereceu um valor mais baixo tem uma visão do valuation da empresa com cifras menores, e por isso, estaria menos interessado que o outro sócio em adquirir o controle.
COMO SABER SE A CLÁUSULA DE BUY OR SELL É IDEAL PARA A MINHA SOCIEDADE?
- Ausência de Sócio Majoritário: a cláusula shotgun apenas tem cabimento caso sua empresa não tenha um sócio majoritário que detém o controle decisório sobre a sociedade. Afinal, caso um dos sócios detenha a maior parte do capital votante, não haverá impasse e ele próprio solucionará a questão controvertida.
- Condições igualitárias: é preciso observar se os sócios estarão em condições de igualdade quanto (i) ao acesso a informações estratégicas da sociedade; (ii) à sua situação financeira e (iii) à capacidade de operar a empresa sem o(s) sócio(s) retirante(s). Caso um dos sócios não tenha conhecimento operacional da empresa para ter o controle sobre o negócio ou não consiga arcar com uma futura compra de participação societária, o mecanismo não deve constar no seu Acordo de Sócios.
Cuidar das condições igualitárias na maior medida possível evita que a cláusula shotgun seja utilizada de maneira oportunista por um dos sócios. Um exemplo disso é quando um deles, sabendo da baixa capacidade econômica do outro, faz oferta de venda das próprias quotas em valor superior ao que o ofertado poderia arcar, não restando a ele outra opção senão a de recusar a proposta e ter que vender sua participação.
Por ser uma medida mais extrema de resolução de conflito, já que provoca a retirada de um dos sócios, as cláusulas shotgun devem ser usadas apenas como a última alternativa para a extinção da divergência entre os sócios, sendo sempre importante priorizar negociações e tentativas de conciliação.
Contudo, caso não haja mais como resolver o impasse, a compra e venda forçada de participação societária pode ser uma alternativa interessante para a sociedade, devendo ser bem pensada e amarrada no Acordo de Sócios por uma assessoria jurídica especializada.
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